STF retoma votação sobre o recurso extraordinário que aguarda continuidade de julgamento desde 2015
A descriminalização do porte de drogas para consumo próprio foi um dos assuntos mais buscados na internet na última semana.
A presidente do STF (Superior Tribunal Federal), Rosa Weber anunciou que incluiu a votação do recurso 635.659, que trata da matéria, para o dia 24 de maio. Esse acontecimento tem despertado grande interesse entre aqueles envolvidos na discussão sobre a legalização da cannabis no Brasil.
Entenda o recurso sobre a descriminalização
A discussão sobre a descriminalização do porte de drogas para consumo pessoal iniciou em agosto de 2015, quando a Defensoria Pública do Estado de São Paulo, apresentou o recurso em favor de uma condenada por portar três gramas de maconha.
“Esse recurso significa na verdade o julgamento da própria lei de drogas, buscando a declaração de inconstitucionalidade do art. 28 da Lei 11.343. Esse recurso tem como base a proteção do art. 5º, inciso 10 da Constituição Federal, que garante a inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e imagem das pessoas”, explica a advogada anti proibicionista Bettina Maciel.
Desde então, apenas três Ministros do STF votaram a favor da descriminalização e dois deles, Luiz Edson Fachin e Luís Roberto Barroso, restringiram a descriminalização ao uso e porte exclusivamente em relação à maconha, mantendo a proibição do porte e uso de demais drogas ilícitas. Já, Gilmar Mendes, estendeu seu voto para outras drogas.
O caso, de relatoria do ministro Gilmar Mendes, tem entendimento firmado pelo STF nesse julgamento e deverá ser referenciado em casos similares em todo o país. A análise será retomada na quarta-feira, 24/05, com o voto de Alexandre de Moraes.
A demora pelo julgamento
Desde que o recurso foi apresentado somam-se quase 10 anos de espera. Para a advogada Bettina Maciel, esse fato se deve por se tratar de um assunto que dialoga com muitos interesses econômicos e sociais.
“Nós sabemos que notoriamente é um assunto que mexe com muitos interesses e segmentos da indústria e do mercado muito bem estabelecidos. A legalização da maconha, principalmente com relação ao uso adulto, com certeza é uma matéria que impacta toda sociedade, não só em termos de política de drogas, mas também em termos de saúde pública e de mercado”, detalha a advogada.
Mobilização nacional pela descriminalização
“Vale lembrar que no último ano a articulação nacional de marchas da maconha, composta por diversos movimentos antiproibicionistas e alguns membros de associações que militam pelas marchas da maconha de suas cidades, têm feito pressão no supremo em um papel educativo e de empoderamento dos usuários e pacientes de todo o Brasil. Acreditamos nas mobilizações populares e seguimos confiantes de que a sociedade inteira vai mudar e a guerra às drogas acabará”, defende Ângela Aboin, coordenadora da FACT (Federação das Associações de Cannabis Terapêutica) e ativista da Marcha da Maconha em Campinas – SP
Alunos da faculdade de direito da USP (Universidade de São Paulo) protestaram a favor da votação pela descriminalização com uma faixa que foi estendida na sala onde o Ministro Alexandre de Moraes foi dar aula no dia de ontem.
O próprio ministro reconheceu o ato como uma manifestação democrática e não pediu a retirada da faixa.
Foi o diretor da instituição, Celso Fernandes Campilongo, que solicitou que os estudantes removessem a faixa, já que esse ato poderia comprometer a votação, por colocar o ministro sob suspeita durante o julgamento.
Descriminalizar para legalizar
O resultado desse julgamento impacta diretamente na política de drogas do país, que se configura como uma política ultrapassada. É urgente uma revisão de como a legislação lida com o consumo de substâncias em caráter individual.
A depender de como o julgamento caminhar, esse fato aproxima a descriminalização da legalização.
Ainda que o consumo e o porte de substância em caráter individual deixa de ser criminalizado, o fato não impede que sejam aplicadas outras sanções de cunho administrativo civil ao indivíduo, porém não mais como configuração de um delito penal.
Isso já representa uma vitória no âmbito pré-regulatório em que o Brasil se encontra.
“Acredito que pautar esse processo agora, é uma resposta do Judiciário à população, frente a inércia do Estado em legislar, em criar leis com critérios objetivos, O Judiciário vêm suprindo essas lacunas, como o que já acontece no que diz respeito aos pedidos de tratamentos pelos SUS, aos Habeas Corpus para plantio e agora, no aguardo da descriminalização do porte para uso próprio ou do cultivo de pequena quantidade. O judiciário está atendendo o chamado da sociedade brasileira. O que se espera é que esse julgamento protagonize uma modificação substancial no sentido de pelo menos estabelecer um critério claro sobre o uso e porte da substância, que automaticamente já vai impactar na política de drogas”, ressalta Bettina.