O potencial dos cannabinoides para tratamento de pacientes oncológicos
Relacionar cannabis e câncer como via de tratamento tem se tornado realidade para diversos pacientes. Estudos e experiências clínicas têm mostrado que a planta pode oferecer alívio significativo para sintomas relacionados ao câncer, principalmente a dor crônica, e aos efeitos colaterais das terapias convencionais, como náseas, falta de apetite, ansiedade e depressão.
Dentro os cannabinoides da planta, onde se concentram os potenciais terapêuticos da cannabis, o CBD e o THC estão entre os mais estudados pela medicina.
Recentemente, uma pesquisa conduzida por cientistas alemães revelou que o THC em doses controladas diárias pode aumentar a expectativa de vida de pacientes em condição terminal da doença em até 15 dias.
Cerca de 9 mil pacientes oncológicos com uma condição limitada de vida em poucas semanas, receberam 5mg de THC todos os dias e seguiram sendo monitorados pela equipe de pesquisadores.
O resultado apontou que essa dosagem foi associada a aumento significativo do tempo de sobrevivência. Além disso, houve um ganho na qualidade de vida, já que os pacientes se apresentaram mais ativos mental e fisicamente.
Alívio de sintomas e efeitos colaterais
Um dos principais benefícios da cannabis para pacientes com câncer é o alívio dos sintomas associados à doença e aos tratamentos convencionais, como quimioterapia e radioterapia.
Estudos demonstram que a cannabis pode ser eficaz na redução de náuseas e vômitos induzidos pela quimioterapia. A American Cancer Society reconhece que a cannabis pode ajudar a melhorar a qualidade de vida de pacientes ao controlar estes sintomas.
Uma pesquisa publicada na revista BMJ Supportive & Palliative Care na universidade canadense McGill, em Montreal, sob liderança do médico e professor Antonio Vigano. revelou que o uso da maconha medicinal pode ser utilizada para amenizar as dores de pacientes oncológicos, reduzindo significativamente a necessidade de analgésicos e opióides.
Os cientistas acompanharam 358 pacientes diagnosticados com câncer durante o período de um ano, sendo a maioria deles mulheres. Foram distribuídos produtos com derivados da Cannabis, o termo científico da maconha, com concentrações diferentes de THC e CBD.
Os resultados eram avaliados a cada três meses com dois tipos de questionários diferentes que mediam a dor em uma escala de 0 à 10. No questionário BPI (Brief Pain Inventory), a redução de dor relatada pelos pacientes foi de 35%, enquanto que no ESAS-r, o outro sistema de pontuação, a dor caiu em 46%.
O THC se liga aos receptores canabinoides no cérebro e no sistema nervoso, reduzindo a percepção da dor. O CBD, por sua vez, possui propriedades anti-inflamatórias que podem contribuir para a redução da dor e do inchaço.
As drogas convencionais utilizadas para amenizar a dor dos pacientes de câncer são os opióides, que são normalmente associados a outros medicamentos como antiinflamatórios e anticonvulsivantes.
A diferença da utilização da maconha para esses opióides é que ela tem menos efeitos colaterais. Entre os 15 efeitos colaterais relatados pelos pacientes, 13 não eram graves – sonolência e fadiga foram os mais comuns.
Estímulo ao Apetite
Outro benefício significativo da cannabis é o estímulo ao apetite, frequentemente reduzido em pacientes com câncer devido aos tratamentos agressivos. Este efeito é particularmente importante para evitar a perda de peso e a desnutrição, que podem comprometer ainda mais a saúde dos pacientes.
Propriedades Antitumorais
Embora as pesquisas ainda estejam em estágio inicial, alguns estudos pré-clínicos sugerem que a cannabis pode ter propriedades antitumorais. Pesquisas conduzidas em laboratórios indicam que o THC e o CBD podem inibir o crescimento de células cancerosas e até mesmo induzir a morte celular em certos tipos de câncer.
No entanto, estes resultados ainda não foram confirmados em estudos clínicos em humanos, e mais pesquisas são necessárias para entender completamente o potencial da cannabis como agente antitumoral.
Um levantamento divulgado na publicação científica suíça MDPI, por exemplo, sugere que os canabinóides têm efeitos antitumorais por suprimir a proliferação, a migração e a angiogênese do tumor, agindo direta e seletivamente sobre as células doentes.
De acordo com a médica Maria Teresa Jacob, membro da Society of Cannabis Clinicians (SCC), os canabinóides também teriam a capacidade de potencializar os efeitos dos tratamentos convencionais.
“A combinação desses agentes com a quimioterapia e a radioterapia pode aumentar a efetividade do tratamento. Estudos realizados em humanos portadores de glioma, um tipo de tumor cerebral muito agressivo, sugerem que o THC e o CBD são capazes de diminuir a chance de recidiva da doença”, explica.
Além do glioma, ainda segundo a médica, existem evidências de que os canabinóides são eficazes no tratamento do câncer de próstata, de mama e da leucemia.
O papel das associações para viabilziar o tratamento
Apesar dos benefícios do uso da cannabis no tratamento do câncer, a realidade brasileira ainda enfrenta diversos desafios. Um dos principais é a regulamentação e o acesso.
No Brasil o uso medicinal da planta é autorizado, porém é preciso regulamentar e fomentar a produção nacional de produtos derivados da planta. A Anvisa autoriza a venda em farmácia de alguns medicamentos, porém são restritos e muito caros.
Nesse âmbito as associações cumprem um papel crucial no acesso ao tratamento, pois acolhem pacientes oferecendo desde a consulta médica com profissionais especializados até a faclitação aos produtos derivados da planta.
É necessário um esforço conjunto para superar as barreiras regulamentares e garantir que os pacientes tenham acesso seguro e eficaz à terapia cannabica. Enquanto isso, pacientes e médicos devem continuar a dialogar abertamente sobre o uso da cannabis, considerando seus benefícios e riscos em cada caso individual.
Referências de pesquisa:
https://spcare.bmj.com/content/13/e3/e1285.info
https://fbh.com.br/canabinoides-podem-ter-efeitos-antitumorais/amp/